quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Vidro dianteiro

Faltava pouco para chegar. Mais ou menos 100km numa viagem de 500. Estavam os dois cansados e os assuntos já tinham se esgotado. Ela continuava com os pés pra cima, encostados no vidro do carro. Não conseguia manter os pés juntos no chão. Ele guiava daquele jeito, ultrapassando com pressa, xingando quem não lhe dava passagem. Ela tinha cansado de reclamar. Dizia que ele parecia um velho rabugento quando fazia isso. Ele continuava fazendo, mesmo ela não gostando. Fazia parte do seu jeito. Ele não podia fumar no carro. Era esse o combinado. Ela não suportava mais o cheiro. Então ele queria chegar logo. Só para poder fumar. Um dia, nervosa, num bar na beira da estrada, ela apontou um homem feio, barrigudo e desleixado. Fumando. Disse que essa era a visão de um fumante. E que nunca ficaria com um cara assim. Mas ficava com ele. Ele ficou nervoso com isso. Não gostou de ser comparado aquele sujeito abandonado na beira da estrada. Ela o conhecia mais do que ele merecia. Nesse tédio todo, ela sorriu. Ele não viu. Ela olhou para os pés grudados no vidro. As unhas pintadas de um roxo quase preto. O dedo maior torto pelos tênis de corrida. O pé dela era feio e bonito ao mesmo tempo. Agora, finalmente, ela aprendeu a gostar. Ela sorriu pois lembrou do dia que estourou o vidro do carro. Não esse. Não desse. De um outro. Há muitos anos atrás. Tentou se distrair lembrando como tinha sido. Ele foi buscá-la no aeroporto. Não se viam há alguns meses. Tinham terminado e voltado várias vezes. A ultima briga, o ultimo desencontro tinha sido pra valer, meses antes. Ela não o queria mais. Queria coisas novas. Gente nova. Para ele, era cômodo ficar como estava. Tinha ela quando queria e sem compromisso. Ela não agüentava mais a situação. Terminou. Quando o viu esperando por ela no aeroporto não ficou surpresa. Sabia que ele a esperaria. Ele não dava ponto sem nó. Tinha convidado ela para dar uma palestra, lançar seu ultimo livro na cidade. Por obrigação ela aceitou. Bem, não foi muito por obrigação. Ela queria revê-lo. Também tinha saudades. Tinha saudades das viagens. Dos primeiros encontros. Daquele tesão incontrolável que vinha quando se encontravam. Ele marcava as passagens 3A e 3B. Foi assim que começaram. Num vôo a caminho de Brasilia. Outra palestra, outro lançamento. Ambos casados. Foi uma época boa. Não se arrepende de nada. Lembrou do dia que pegou a ponte aérea para o Rio debaixo de chuva de granizo com o pé quebrado. Só para passar a noite com ele. E não se arrependeu. Nesse dia que ele foi buscá-la no aeroporto, ela sentiu o coração bater mais forte. Quase saltar pra fora. Quis disfarçar, achou que conseguiu. Virou para beijar o rosto e não a boca como ele queria. Em pleno aeroporto. Ele não tinha vergonha. Dava para perceber o volume na calça de brim. Ela sabia que ainda o excitava. E ele fazia questão de não esconder. Entraram no carro e foram direto para o lançamento. O vôo tinha atrasado e não tiveram muito tempo para conversar. Discutiram como ia ser a palestra e o que ela gostaria de fazer depois. Disse que ia ser o motorista e cicerone dela por toda a noite. Ela podia pedir o que quisesse. Ele sempre tinha esse ar sedutor. Ela sabia que não dava mais. Sabia que seria só uma transa. Mas nem isso ela sabia se queria. Foram ao evento e depois foram jantar. Só os dois. Ela queria algo leve, natural, na beira da Lagoa. Ele acertou em cheio no pedido. No final do jantar, não resistiu e beijou-lhe a boca. Uma freada fez ela voltar ao presente. A freada vem sempre seguida de um gesto obsceno e um palavrão. Pediu para ele ir mais devagar, mas ele tinha pressa em chegar. Virou para o lado contrario ao dele. Olhou a paisagem. Voltou a ter lembranças. Depois do jantar ele a levou para o hotel. Tinham ainda um longo caminho pela frente. A lua cheia brilhava firme na Lagoa da Conceição. Paisagem melhor não podia ter. Ela grudou os pés no vidro do carro. Ele sorriu. Ela também. Estava de vestido e quando colocava os pés pra cima a saia descia naturalmente. As pernas bronzeadas estavam na posição que ele mais gostava. Ela também. Ela queria que ele a tocasse e foi isso que ele fez. Enquanto dirigia de volta ao hotel. Pelas curvas da lagoa. Não demorou muito para ela gozar ali, poucos quilômetros depois. Nem 10. Com os pés grudados no vidro. E os dedos dele dentro dela. A força do gozo fez o vidro do carro explodir. Ela se assustou. Ele riu. Ela perguntou e agora. Já passava da meia noite e não ia poder arrumar. Como ele ia chegar em casa com o vidro do carro assim. Ele não queria saber. Não estava preocupado com o detalhe. Queria que ela gostasse e gozasse mais. O prazer dela era o dele. O vidro estava rachado. Ela tirou os pés e ele continuou a guiar. Nada discreto, abriu o zíper da calça. Colocou para fora o pau que estava em posição de ataque. Ela entendeu. Ele a puxou para perto e ela começou devagar. Debaixo para cima. Só com a língua. Depois parou onde mais gostava. Na cabeça. Segurou firme embaixo fazendo pressão. O movimento da boca fazia coro com as curvas. Deixava ela com mais tesão e vontade. Foi rápido. Ele gozou antes de chegar na cidade. Na boca dela. Do jeito que eles gostavam. Ela levantou a cabeça e ele passou o lenço de papel que estava no porta luva. Ali ela observou os brincos, batom e uma chupeta. Ele fechou rápido. Ela não se importava mais. Seguiram para o hotel conversando sobre futilidades da vida. Ele a deixou no hotel, a beijou no rosto e ela foi embora. Dormiu tranqüila e feliz. Outra freada e de novo a realidade. Faltam ainda uns 60 km. Ele diz que vai parar. Ela sabe que ele precisa fumar. Abaixa o pé do vidro e se olha no espelho para passar batom. Sorri para ela mesma. Estava molhada. Ele para o carro e diz que volta já. Ela desce junto. Se alonga. Olha pro sol e sente o calor. Ela só quer chegar. Pede pra guiar agora. Quer ouvir musica e cantar ate chegar lá. Ele não entende o que aconteceu nos últimos 50 km. Dizia que ela não respondia o que ele perguntava. Que ela estava longe. Em outra viagem. Ele também a conhecia.

Para JV